Esta semana estamos a ler o conto de Ana Maria Magalhães e de Isabel Alçada: " O NATAL DAS BRUXAS",
No castelo tenebroso, estava um ambiente de cortar à faca! As três bruxas não faziam outra coisa senão resmungar, lamentar-se e dar largas à fúria, com pontapés nos gatos e vassouradas nos morcegos.
- Não há dúvida! - berrava a mais velha. - Vivemos aqui há séculos e nunca o Pai Natal se lembrou de nós!
- Nunca, por nunca ser, tivemos um presente no sapatinho!
- No sapatinho? Tu queres dizer é no sapatão. Ora olha bem para o tamanho do teu pé. Calças para aí o quarenta e quatro – respondeu-lhe a irmã mais nova, cheia de maldade, ou não se chamasse ela Rosa Maldosa.
Ao ouvir aquilo, Rita Maldita saltou de trás do caldeirão onde borbulhavam poções maléficas e deu-lhe um estalo.
- Toma que é para aprenderes. Já sabes que não tolero que falem do tamanho dos meus pés! (...)
- És horrorosa, Rosa Maldosa!
- E tu nem chegas a ser parva... és parvalhita, Rita Maldita!
A irmã do meio assistia, abanando a cabeça com visível enfado. Como é que haviam de ter presentes, se se portavam daquela maneira? Brigas constantes afugentavam qualquer Pai Natal bem intencionado. Gostaria de lhes fazer ver que assim não ganhavam nada (...)
- Vamos ao Pólo Norte dizer umas verdades ao Pai Natal!
- Boa ideia! (...)
Num ápice, foram ao baú onde guardavam as casacas de toupeira para ocasiões muito especiais e agasalharam-se. Não era preciso deitarem-se a adivinhar. Sabiam que o vento daquelas bandas era gélido!
Depois assobiaram para chamar as vassouras, montaram e lá foram pela janela fora! Nenhuma confessou, mas iam radiantes! (...)
O Pai Natal, coitado, quando as viu pela frente teve um baque. Que lhe quereriam aquelas três loucas? O mais certo era virem empatá-lo e o pior é que já só tinha uma semana para organizar os lotes das prendas. Tentou encontrar uma boa desculpa para as mandar embora, mas elas não lhe deram tempo e desataram numa gritaria infernal.
- Viemos protestar!
- Exigimos justiça!
- Nós também temos direito. Queremos prendas!
- Prendas como as outras pessoas!
- Não temos culpa de sermos bruxas.
- Nascemos assim, temos que fazer maldades.
- Foi por isso mesmo que nos deram estes nomes começados por mal: Maldosa, Maldita, Maldição!
O pobre velhote deitou as mãos à cabeça. Que havia de fazer para se ver livre delas?
- Vocês sabem muito bem que não posso dar presentes a quem faz patifarias - arriscou com voz débil.
A resposta veio sem frases que se atropelavam num frenesim:
- Patifarias? Patifarias não!
- Asneiras! Pequenos disparates como toda a gente.
- Claro! Somos bruxas, fazemos bruxarias.
- Tudo coisas sem importância: poções para tornar amargo qualquer doce, pozinhos para as crianças poderem arreliar as pessoas mais velhas ou xaropes para as pessoas mais velhas obrigarem os mais novos a irem para a cama. (...)
Receando que discutissem toda a noite, o Pai Natal ordenou:
- Calem-se! Se não se calarem imediatamente garanto-vos que nunca na vida hão-de receber um presente.
A ameaça funcionou. Muito juntas foram-se chegando para ele. Pela conversa, pareceu-lhes que encarava a hipótese de as presentear.
- Vão-se embora - pediu o Pai Natal, agora mais calmo. Deixem-me trabalhar sossegado.
Não prometera nada, mas havia qualquer coisa no tom de voz que lhes deu esperança. Esperança de ver um daqueles lindos embrulhos cair pela chaminé. (...)
Nunca mais chegava a noite de Natal. Nunca mais chegava a hora de saber se desta vez, sim, seriam contempladas. Mas valeu a penal Era meia-noite em ponto quando ouviram uma restolhada sobre as telhas. (...)
Da chaminé desciam lentamente três embrulhos, tão lindos como nunca tinham visto outros!
Ansiosas, precipitaram-se para saber qual era o seu. E o coração derreteu-se-lhes quando deram com os olhos nos cartõezinhos:
- Oh! Já viste o que o Pai Natal escreveu?
- Que querido!
- Adoro o Pai Natal!
- É o velho mais simpático do universo!
A alegria tinha razão de ser. O Pai Natal, em vez de usar os nomes delas, escolhera outros mais a seu gosto: Rita Bonita, Rosa Cheirosa, Conceição Bom-Coração.
Nunca ninguém lhes tinha chamado assim e sentiram-se tão felizes que, por um momento, desejaram proceder como o Pai Natal, apeteceu-lhes alterar as coisas, substituir malefícios por benefícios, enfim, apeteceu-lhes deixar de ser bruxas.
Mas quem é que pode fugir ao seu destino?
Ainda não tinha batido a uma hora, já andavam à bulha com inveja do presente das irmãs.
Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada, O Natal das Bruxas
O Natal das Bruxas
Etiquetas: "Hora do Conto"Publicada por Crescer Sem Limites à(s) 21:23
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